Publicado em 10 de Janeiro de 2018 às 12:41 em: Notícias
A genética clínica vem conquistando um avanço notável no Brasil e especialmente em Pernambuco. Recife é a sede de um dos laboratórios pioneiros na área, a Genomika Diagnósticos. À frente dele, Dr. João Bosco de Oliveira. Formado em Medicina pela Universidade Federal de Pernambuco, com especialização e pós-doutorado em Imunologia clínica e laboratorial pelo NationalInstitutesof Health, EUA, doutorado em Patologia Clínica pela Universidade de São Paulo e Ph.D. em Imunologia Experimental pela Universidade de Amsterdã, Dr. Bosco é uma referência na área. Atualmente, o especialista atua como diretor executivo do Laboratório Genomika Diagnósticos, localizado na Ilha do Leite, no Recife, e participa de projetos em diversas instituições locais na área de genética. O médico-cientista com mais de 10 anos de experiência em genética e imunologia, conta mais, nessa entrevista, sobre a genética e como essa área pode ajudar na prevenção e controle de doenças.
O que é genética clínica?
É uma especialidade que trabalha na prevenção, diagnóstico e tratamento das doenças hereditárias, defeitos congênitos e doenças raras.
Quais os principais exames realizados nessa área?
Há atualmente quase 3 mil doenças genéticas diagnosticáveis por testes moleculares. Quase todos esses testes envolvem o estudo do DNA do paciente, através de diferentes metodologias. Mais recentemente, foi introduzido na prática médica o método de sequenciamento de segunda-geração, que permitiu uma grande redução do custo e um aumento da velocidade e precisão da execução de testes genéticos. A Genomika se especializou na aplicação dessa metodologia para melhorar a prevenção, o diagnóstico e o tratamento de pacientes no Brasil. Para citar alguns desses testes, há o Sequenciamento do Exoma Completo, que avalia todos os cerca de 20 mil genes que formam o genoma humano na busca de mutações associadas às doenças. Esse teste permite detectar doenças genéticas raras de forma rápida e custo-efetiva, diminuindo a odisseia das famílias em busca de um diagnóstico preciso. Outro grupo de exames que merece citação são os testes que avaliam se uma pessoa tem um risco aumento de desenvolver alguns tipos de cânceres, como mama, intestino, próstata, endométrio, entre outros. Nosso laboratório, por exemplo, oferece um painel que avalia 38 genes simultaneamente e, a partir dos resultados deste exame, o paciente, em conjunto com seu médico, pode planejar o melhor programa de prevenção para o câncer, com dados personalizados, baseados na sua constituição genética. Para aqueles que já estão diagnosticados com câncer, saber qual a mais adequada droga para esse tipo de doença também é de extrema importância para a eficácia do tratamento. É para isso que outro exame genético, o Oncoscreen, é utilizado. É um exame realizado no DNA e RNA do tumor para definir que drogas podem ser mais eficientes no tratamento daquele câncer. A definição dessas alterações genéticas permite uma caracterização rápida e segura de cada caso analisado, com ganho de tempo e segurança nas decisões que serão tomadas. Por último, podemos citar o exame CGH Array, que é uma técnica molecular que permite identificar alterações cromossômicas, sendo indicado em casos de suspeita de autismo, atraso de crescimento, atraso de linguagem, anormalidades congênitas, atraso no desenvolvimento neruropsicomotor, entre outros.
De que forma o estudo genético pode contribuir na prevenção e controle de doenças?
Na prevenção existem várias formas de contribuição. A principal é o estudo de genes que dizem se você tem risco aumentado de desenvolver um tumor. A partir daí, ela pode ser feita desenvolvendo um plano de prevenção específico para aquela pessoa, uma verdade Medicina Preventiva Personalizada. Por exemplo, mulheres com alteração em um gene chamado BRCA têm até 85% de chance de desenvolver um câncer de mama, devendo começar a fazer ressonância magnética das mamas aos 25 anos, um procedimento que nunca é feito em mulheres da população normal, sem a alteração. Esse seguimento mais intensivo não impede o aparecimento do câncer, mas permite a detecção das formas mais precoces e curáveis da doença. No tratamento, a genética ajuda a diagnosticar o que era mais difícil de ser detectado. Passavam-se meses e anos para se descobrir, por exemplo, certas doenças neurológicas, quando hoje se pode fazer um teste que mapeia todos os genes do indivíduo, como o Exoma, que permite o diagnóstico em três, quatro semanas. Outra forma, em Oncologia especificamente, é quando se utiliza a genética para guiar um tratamento, tornando-o mais personalizado. Os casos mais comuns que contam com esse tipo de tratamento são os de câncer de pulmão, mama, melanomas, cânceres de intestino. A genética hoje é uma realidade na prática clínica, sobretudo quando se trata dessa possibilidade de tratamento individualizado.
Qual a tecnologia utilizada?
É a tecnologia de sequenciamento de segunda geração para diagnóstico de doenças genéticas.
A população em geral acredita que esses tipos de exames são inacessíveis devido ao seu alto custo. Isso é um mito? O acesso a esses exames está sendo facilitado?
Alguns pacientes ainda tendem a acreditar, por falta de conhecimento, que a realização destes exames possuem custo elevado e são distantes de sua realidade. O que muitos não sabem é que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) determina em suas normas que alguns testes genéticos devem ser cobertos pelos planos de saúde de maneira obrigatória, desde 2014. Essa lista é atualizada a cada dois anos, e já inclui mais de 30 doenças diferentes. Em contraste, praticamente nenhum destes testes é disponibilizados no SUS, aumentando a disparidade de acesso em uma área tão importante.
Quando e como surgiu o laboratório Genomika Diagnósticos? Como a empresa está estruturada hoje?
A Genomika foi criada em 2013, no Recife, por empreendedores especialistas em genética (João Bosco) e em Tecnologia da Informação (Ikewai). Dessa fusão surgiu uma empresa que emprega alta tecnologia, a partir do Recife, para ajudar pessoas em todos os cantos do território nacional. A empresa hoje conta com mais de 50 funcionários e tem filiais no Recife e São Paulo, e com planos de abrir mais quatro unidades em outras capitais, até o final do primeiro semestre de 2018.
Como funciona a parceria entre o Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo, e o laboratório Genomika Diagnósticos, com sede no Recife?
Para ampliar o acesso no Brasil a testes de sequenciamento genético utilizando tecnologia de segunda geração, o Hospital Albert Einstein firmou essa parceria com o laboratório Genomika Diagnósticos. A escolha fez parte da iniciativa do Einstein, que analisou centenas de startups da área de saúde para criar parcerias visando à melhoria da assistência à saúde no país. A Genomika foi escolhida por desenvolver tecnologias de ponta para a realização de exames genéticos com foco no diagnóstico clínico. A parceria tem o objetivo de acelerar o desenvolvimento do know-how brasileiro e desenvolver tecnologia de ponta na área de diagnóstico genético, equiparando-o aos melhores centros internacionais. Com a parceria, a Genomika passou a ter acesso a vários fóruns da comunidade médica do Einstein para disseminar o conhecimento, a aplicação e a ampliação do portfólio de testes genéticos. O conselho técnico-científico e de qualidade do laboratório terá a participação do Einstein nas decisões de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e tecnologias, assim como na melhoria constante dos seus processos internos. A partir de maio de 2017, o Einstein e o Genomika ampliaram a parceria firmada no final do ano de 2015 com extensão de seu acordo de cooperação e passaram a atuar mais fortemente na disseminação da aplicação clínica de exames de sequenciamento genético para todo o Brasil. A expectativa é de aumentar o portfólio de exames para mais de 500 testes genéticos para várias especialidades médicas, como oncologia, neurologia, hematologia e doenças raras. Com a abertura de cinco novas unidades em grandes cidades, a expectativa é atender mais de 50.000 pacientes até o final de 2018, ano em que também serão inaugurados os novos laboratórios de sequenciamento genético e técnicas moleculares, no novo Centro Integrado de Diagnósticos Laboratoriais do Einstein, no Butantã.